domingo, 13 de novembro de 2022

Ímpeto fervor

Andréa Melo












Se você soubesse o quanto eu quero te beijar

não me deixaria chegar tão perto

O desejo ruborizando meu rosto

imaginando a reciprocidade no teu olhar

mas não há.


O que você tem, que mexe tanto assim comigo?

Que fascínio é esse que a tua presença me impele?

Que domínio é esse que vem da tua pele

e me despe o juízo?


Que cor é essa que reveste a tua boca 

e escraviza os sentidos?

O desejo me invade,

eu não vejo mais nada, 

eu não ouço mais nada. 

Tudo fica distorcido.


Você  fala mas não há ruído.

Há apenas a sinfonia harmoniosa

dos teus lábios, dentes e língua

Música  silenciosa. 

Instrumento mudo. 

Melodia insana

O som que o teu olhar emana

desarma meu sorriso


Ah, se você soubesse que eu preciso te beijar.

Tocar teus lábios,

sutilmente com a ponta dos dedos

sentir as pequenas fissuras

sobre a superfície seca,

atravessar esse deserto 

até o rio que corre em tua língua


Eu devo estar louca

Cada fresta que reveste a tua boca

é um convite ao abismo

e eu preciso pular.


Se você soubesse o quanto eu quero te beijar

mas não se trata disso

se trata do quanto eu quero que você me beije. 

Eu quero que você me deseje, 

além do corpo, 

além da alma. 

Um desejo simples, aberto, inteiro


Se você soubesse o quanto eu quero te beijar… 

nunca me deixaria chegar tão perto. 

Nunca mesmo.


Milk

sábado, 8 de outubro de 2022

Maria Maria

 

Michelle Garcia                  @michelle_s_garcia









Tão sensível esse amor que te dou

e tão angélico

feito pérola rara

valiosa

bela

formosa


tão singelo esse amor que te dou

e infinito

universo em expansão

desmedido

coração


tão perfeito esse amor que te dou

como canto do pássaro

a paz em minh'alma

o choro que acalma

o sono que encanta

a beleza em constância


tão poderoso esse amor que te dou

e logo tão delicado

que se entrega em vida

que se faz florida

bosque ... primavera plena

ator ... catarse em cena

que oferece o eu

quanto mais de mim

mais se multiplica


tão infinito esse amor que te dou

e tão presente

em cada sorriso

gesto

noite

lágrima

banho

nascente,

afago

trescalo delicado

amor

incomensurável

que fez de duas vidas

duas Marias

quatro histórias

Helena … Heloísa.


Emiliano

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Melancolia

@diogotalon.666















Como juntar os cacos de uma alma arrasada?

Como escrever um poema com uma rima inacabada?

a madrugada observa,

como um vampiro tolo

sedento de sol,

o meu peito aberto

onde estima e autoestima colidem

enquanto a noite passa


em meu quarto,

a sós,

cama

trouxas

roupas 

lençóis

o frio

e a lágrima

desenham o meu rosto,

e o sangue feito lava

entre tatos e contatos

sonho e realidade

derrete

insensível

meu espírito frágil


observo adiante

um fantasma de olhos frios

e coração quente

sem ardor

tal menino apático

que um dia disse ser

a minha única companhia

me estender as mãos

e declarar

“eu sou assim

monossilábico

monotemático

explosão de sentimentos

emanando em fio

estreito, raso e a conta gotas.”


E na manhã que se aproxima

me assombra essa presença

de fragilidade aparente

e palavras firmes

sem compaixão

nem poesia

nem afago

volúpia

virtude

clima.


Emiliano.

segunda-feira, 29 de agosto de 2022

SONHO

 

Flávio Dutka


Essa noite tive um sonho estranho. Desses que não se sabe, sonho, lembrança ou fantasia. Sonhei que caminhava num jardim imenso, o barulho das folhas dançando, o verde vivo das árvores e o colorido das flores brilhando sob o sol intenso do meio dia. Tudo era claro e brilhante, num vento morno e convidativo. Pouco distante eu avistei três silhuetas. Eram distintas damas que discutiam sobre alguma coisa. Parecia muito relevante e insuspeito. Estavam sentadas ao redor de uma pequena mesa redonda, trabalhada no ferro numa pintura descascada do que um dia já foi branco.  
Eu me aproximei timidamente. Na lapela de seus vestidos eu notei bordado delicadamente a letra “C”. 
Eram tão diferentes e ao mesmo tempo exalavam a mesma afinidade rutilante. Tinham uma brisa sábia no falar. E falavam sobre tantas coisas: livros, música, política, educação, homens, mulheres, sobre o passado e o futuro. 
Riam de quase tudo, quase, quase tudo. 
Seus gestos e suas vozes mostravam a maturidade de quem já vivera muitas décadas e sabiam das dores do amor e da fugacidade. Mas em seus semblantes eu vi o brilho dos que acabaram de chegar. Estas jovens senhoras estavam visivelmente apaixonadas pelas palavras, pela literatura, pela vida. Eram amantes da poesia, me confessaram, despudoradas experientes na arte de compor. Estavam tão vivas, tão reais.
Numa gentileza prosaica a primeira me ofereceu  uma xícara de café. Ora, um cafezinho é sempre bem vindo, mesmo num sonho. A segunda me ofereceu um assento onde a luz do sol brincava com as sombras das folhas, me pareceu um lugar perfeito para sentar. A terceira me ofereceu um segredo mundano, que agora, agorinha eu não consigo me lembrar. Por alguns minutos eu esqueci que era tudo um sonho.
Eu parei alguns instantes de ouvi-las e comecei a observá-las com mais detalhes.
A primeira vestia branco, um branco encarnado e cru, nos olhos miúdos uma leveza e uma doçura que impunha as demais um tom matriarcal. Sobre a cabeça os fios ainda mais brancos escondiam poemas antigos que ela retirava e nos servia num pires sorrindo, sempre sorrindo. Quando lhe perguntei seu nome ela respondeu: - Meu nome é coração!
A segunda vestia azul, um azul indescritível que se movia ora azul claro, ora azul marinho. Um azul que se perdia, ora nos olhos, ora nas palavras de um menino. Eu poderia nadar pra sempre em todo aquele azul. Tinha um ar de mestra, maestra, maestria. Sobre as pernas cruzadas ela trazia um caderno, onde escrevia em silêncio. Exceto quando abria a boca para cantar uma melodia extremamente azul e quando perguntei seu nome ela sussurrou: - Meu nome é canção! 
Por fim eu me encantei com a terceira dama. Vestida de amarelo desbotado, na cabeça um lenço dourado, no rosto um sorriso e uma risada que irradiavam na pele negra iluminada. Tudo que ela falava nos fazia rir e chorar, nos fazia chorar e sorrir. Pois ela falava de tantas coisas importantes, de coisas dolorosas, de coisas coloridas e desbotadas. Para cada palavra que saia da sua boca uma cor se abria no jardim. Eu vi dentro dela um enorme vazio que ela preencheu com milhões, com bilhões de palavras que caíam do seus olhos. E antes que eu pudesse perguntar seu nome, ela se ergueu altiva e gritou: - Meu nome é coragem! E neste brado eu despertei. 
Essa noite tive um sonho estranho. 
Desses que não cabe, sonho, lembrança ou fantasia. 
Essa noite eu vivi um sonho. Um delírio poético que não posso explicar.
Quando dei por mim o dia amanhecia e o sol dourado e preguiçoso se despedia da noite fria e invadia as frestas da minha janela. 
Por alguns minutos eu tive a certeza insana que tudo foi real. 
E eu nem pude me despedir de minhas adoráveis damas, e afinal, sobre o que tanto discutiam com tanta paixão, graça e alegria. 
Acho que nunca vou saber. Só sei que passei o dia sorrindo, e juro, ainda estou sentindo o gosto de café e poesia. 




Milk




domingo, 28 de agosto de 2022

Diário

Flávio Dutka


Páginas vazias

Preenchem o mês de agosto

Nada foi escrito

Tudo foi sentido

Na carne 

a contragosto


Milk

domingo, 31 de julho de 2022

Poemática


Luis Dantas                        @luizdantart












Patifes

Pulhas

Poetas

Povoam me espelho

Poluem meus suspiros

Partilham minha alma


Poetizas

Prostitutas

Paramorfas

Pintam meus pecados

Penteiam minha pele

Praguejam minha calma


Pobre de mim

Parasita aprisionada

Poesia impura 


Pobre de ti

Petiz despreocupado

Poema in natura


Milk

domingo, 24 de julho de 2022

Fúria


@alexandmend 









Cada vento que soprares

Das narinas dos lugares onde não estou presente

Não serão suficientes

para enxugar o meu rosto

Tua face enrugada e fria

e toda a injúria que dizias

não serão eficientes

em aplacar tua fúria 

 

E tu me acusas – Triste!

E tu me acusas –Deprimida!

Mas das dores que me doem 

sou apenas alpinista

 

Eu não inventei a tristeza e a chuva

Mas espero por elas

em cada lamento

em cada trovão 

sem capa, sem abrigo

eu enfrento a tempestade 

 

E tu me acusas – Louca!

Pois permaneço sorrindo no portão 

esperando o fim da chuva

e os breves e ensolarados 

dias que ainda virão...


Milk

domingo, 17 de julho de 2022

Apassiva

Israel Vale                                                @israelvalejr

 








Ah se pudesse te tirar do pensamento 

dos meus desejos

dos meus versos


Se pudesse apagar 

esse arrepio

esse tato tatuado sobre a pele

esse teu cheiro em minhas mãos 


Se pudesse esquecer tua voz

E a malícia inocente

do teu sorriso


Ah se eu pudesse 

ir embora agora 

e abraçar tua ausência 

como o único presente permitido


Se pudesse limparia teu beijo 

da memória do passado

e dos futuros planos


Ah se eu pudesse não te amar 

eu te desamaria sem demora

com a mesma inquietude e devoção

 com que te amei todos esses anos


Milk

domingo, 10 de julho de 2022

Breve prosa

 

Elias Santos                             @van_rabsk















Tentamos não criar expectativas,

ser racionais mas, no íntimo, 

queremos mais,

queremos ir além,

bramir, arrebatar, planar

com a brisa fresca

e as cores da estação.


E então,

quando sabemos

que é o fim da estrada,

que um pouso forçado

consumou a jornada

fica um vazio difícil de lidar

e no clamor do querer mais

o que ecoa

é a lacuna e o silêncio.


Emiliano


domingo, 3 de julho de 2022

Tacto












Não há poemasnem rimasnem clima
Não há fragrâncianem olharesnem lugares
Não há calornem furornem flor
Só há espaçoSem arSem marMuito toque na telaNenhum toque na pele.
Emiliano

quarta-feira, 22 de junho de 2022

Abrigo

@oxente_thaina














É 

Eu também tenho 

Um pássaro azul no meu peito

Inquieto, indiscreto, insuspeito

Eu nunca sei o que

Ele pretende fazer

Não vai embora

Nem fica dentro 

As vezes dorme por longo tempo

Até me deixa esquecer

Mas no instante seguinte 

Extrapola os limites

Grita, xinga, agride

E sem eu perceber

Se aninha de novo em meu peito

Meio envergonhado, quase sem jeito

Ele volta a adormecer


Milk

domingo, 5 de junho de 2022

Desabafo



Mario Venere                  @mario_roberto_venere_1954


ressoando ao sabor da vida
nos desafios de uma existência incompleta
incerta, deserta, vazia
tateio o frágil tecido do sonho
com suas expectativas e utopias
decerto desprovidas de realidade
na esperança de sentir em pele, corpo e alma
a história de amor antes nunca vivenciada


me transverso em Cyrano de Bergerac
vivendo em sombras
perdido em si
coberto de medo
reprimido em segredos
condenado a amar a distância


sem ter a ousadia necessária
virtude, solitude ou audácia
de se expor, romper temores
colher desamores
para enfim viver o grande Amor


será esse o meu destino?
viver sob o espectro de uma vida
que sempre está por vir?


Ah meu bom amigo
essas coisas do coração não tem receita,
não tem cartilha,
não tem conselho amigo que sirva.

Emiliano

domingo, 15 de maio de 2022

Livres












É a liberdade que não vem
angústia que aprisiona
apego que sufoca
a dependência que afoga

corrente que teima a pesar
as entrelinhas que insiste em vigiar
essa rotina que não deixa escapar

segue a tua estrada
persegue a tua calma
me liberta desse nó
me deixa estar só

não aprisione a alma
que nasceu liberta
tomando o seu ar, seu mar
sua terra, sua rima
sua estima

tua senda segue livre
reencontre teus passos
e um futuro 
de incríveis possibilidades
e infinitas paisagens 
te aguardam ao abrir dos olhos

Emiliano














Não fique tão contente
Se te dei amor derradeiro
Todo homem que já amei
Acredita que foi o primeiro

Não me culpe se de repente
Você parecer tão suscetível
Todo homem que já amei
Se julgou inesquecível

Não fique tão prepotente
Se me fez arder em chamas
Todo homem que já amei
Acredita que é bom de cama

Então, não seja condescendente
Se eu chorar na despedida
Todo homem que já amei
Foi o amor da minha vida


Milk


segunda-feira, 7 de março de 2022

Subversiva

 








 



Minha bolsa é meu mundo
nela levo tudo
ou quase tudo 
de essencial

É um verdadeiro caos

Numa tarde me perco 
em meio a bagunça 
na procura por um objeto

Retiro alguns itens 
baton
papéis
alguns anéis
um velho jornal

Ao lado minha amiga feminista
se admira com um livro
“Bukowski?!  
Sabe que esse cara 
é um machista escroto...”

Pensei no que Charles diria...

Sim, mas gosto dos poemas dele
Então... foda-se

Ela pega outro livro 
e sorri
"Ah, Anais Nin..."

Esse ela aprova

Enquanto devolvo os livros
a desordem original
ela questiona
“E você leva esses dois pra todo lado?”

Pensei no que Anais diria...

Sim
gosto de imaginar
a putaria que eles fazem
na minha bolsa.

Milk

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Esperançar

 

Flávio Dutka                     @flaviodutka


A verve do amor constante
a história de amor distante
solitude se converte em solidão
quando fito o vazio da existência
incompleta, incerta, amena

O espaço da cama vazio
sem carinho, desejo, ruído,
sozinho
nem briga, nem reconciliação
nem mãos dadas, nem incompreensão
nem afeto, nem faísca
nem conversa, nem malícia
Só fervor ...

De acordar lado a lado
sentir um afago
prover o meu tato ...

E você nem existe
além da ideia, inspiração e do querer
Que anima a criação de um poema
Pra musa que ainda não encontrei
apenas sonhei

Pois sou poeta
acredito no amor
e muito além de divagar...
eu ouso sonhar

Emiliano